10/07/2011

A frustração do dia seguinte na Educação

post do Octávio Gonçalves, aqui


Infelizmente para os professores e para a escola pública, o essencial das expectativas, das convicções e dos desejos avançados, por mim, ao Magazine de Educação, para efeitos desta peça jornalística, não apenas não se concretizou, como a pílula do dia seguinte, a que Pedro Passos Coelho recorreu, fez abortar a relação de confiança no Primeiro-Ministro, consumou uma desonestidade política em termos de avaliação de professores e patenteou um Governo impreparado em matéria de Educação (condição por excelência para se ser capturado pelas estruturas do Ministério da Educação).
Aqui fica a versão integral das minhas respostas às questões formuladas pelo Magazine de Educação:

  • Novas eleições, novo Governo. O que perspetiva para a Educação para o próximo ano letivo e o que espera desta nova legislatura?
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Em geral, tenho a expectativa de uma legislatura marcada pela adopção de uma nova postura relativamente às escolas e aos professores, em que prevaleçam os eixos abertura e envolvimento dos actores no terreno, valorização/dignificação da docência, reforço da autoridade dos professores, promoção da ética do trabalho e da exigência para professores e alunos, autonomia das escolas e concomitante responsabilização.
Para tal, espero que o paradigma de actuação impositiva seja substituído pela negociação, da mesma forma que as tentativas de domesticação e a desconfiança em relação aos professores dêem lugar à valorização e dignificação públicas da função docente e ao aprofundamento progressivo da autonomia das escolas, libertando-as da torrente de leis, decretos, normativos e regulamentações (a maioria dos quais precipitados, impreparados e imbuídos de uma orientação facilitista e negligenciadora do empenho e do mérito).
Porém, não escondo a convicção que a esperança na actuação do Ministério da Educação é contingencial à escolha do futuro Ministro, uma vez que, face à necessidade de “melhoria” das linhas programáticas do PSD, a personalidade escolhida fará toda a diferença.
Todavia, o próximo ano lectivo ainda deverá constituir uma fase de transição, apesar de tudo sem a crispação e a desmoralização dos últimos seis anos, mas em que se torna imprescindível, tanto a reorientação do trabalho dos professores para o ensino, descentrando-os da sua própria avaliação e das burocracias inúteis, como a reorganização do sistema educativo, no sentido da simplificação e da racionalização da regulamentação legal e dos procedimentos escolares. Posteriormente, deverá seguir-se a reorganização curricular.

  • Qual o perfil ideal para liderar o próximo Ministério da Educação?
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A liderança do Ministério da Educação, tendo em conta a degradação da Educação e o ataque ao estado anímico dos agentes educativos, enquanto heranças de seis anos de arrogância e de incompetência socrática, deve obedecer a um perfil que seja susceptível de reunir as seguintes características:
- ser uma figura capaz de suscitar a adesão das escolas, evidenciando capacidade mobilizadora;
- conhecer profundamente a realidade da Educação, dominando, como ninguém, o diagnóstico dos problemas e a adequação das soluções;
- dispor de um historial de posições e de ideias, no qual os professores, as escolas e a maioria dos portugueses se revejam;
- representar uma ruptura efectiva com o rumo e com a ruinosa herança socrática em matéria de Educação;
- possuir uma robusta preparação pessoal e uma capacidade argumentativa para defender, com coerência e eficácia, uma política educativa e as suas medidas.

  • Na sua opinião, quem julga reunir essas características? Porquê?
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A pessoa que melhor conjuga as características atrás referenciadas é, de longe, o Professor Santana Castilho.
Nenhum quadro do PSD e do CDS na área da Educação, nem mesmo nenhum outro independente, dispõe do prestígio, do apoio nas escolas e de um crédito de expectativas positivas que sejam comparáveis àqueles de que goza o Professor Santana Castilho, do mesmo modo que estamos em presença, como ainda recentemente o escrevi, da personalidade mais bem preparada, quer em termos do conhecimento do sector da Educação, do diagnóstico dos problemas e do aporte das soluções para os mesmos, como ao nível da capacidade de pacificação das escolas e de mobilização dos actores, que, no terreno, constituem a garantia da implementação e do sucesso das mudanças que se impõem.
A estas capacitações acresce o facto de o Professor Santana Castilho incorporar saber, experiência, verbo fluente e qualificado, bem como robustez argumentativa, que lhe conferem características inigualáveis para os difíceis combates políticos, nas suas vertentes parlamentar e mediática, que a coligação governamental não deixará de enfrentar.

  • O que falhou na relação entre os professores e o anterior Governo e o que deve ser realizado para assegurar essa boa relação?
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Em primeiro lugar, começou por falhar a atitude, politicamente estratégica, que foi adoptada pelo Ministério da Educação em relação aos professores, a qual privilegiou a via da confrontação prepotente, da hostilização permanente, do diálogo crispado, da desautorização e, mesmo, do enxovalho público dos professores, ignorando uma regra básica da gestão: não é possível assegurar a implementação e o sucesso de medidas ou intervenções, ao mesmo tempo que se menoriza, se desautoriza, se procura lançar o descrédito e, ostensivamente, desprezar o contributo daqueles que, além de melhor conhecerem os constrangimentos e as potencialidades de acção no terreno, também são os que podem, pela sua motivação e envolvimento, determinar a eficácia das medidas.
Depois, falhou a inteligência política e gestionária das equipas que chefiaram o Ministério da Educação, que, uma vez amarradas à âncora identitária do pior do socratismo, ou seja, o autoritarismo sem autoridade e a subjugação à fachada propagandística e ao mero impressionismo estatístico, se revelaram incapazes de encetar um projecto de efectiva qualificação dos alunos, de promover climas participativos e cooperativos, bem como de potenciar os saberes e a experiência dos professores.
Mas, também falhou a preparação política, técnica, científica e pedagógica das equipas dirigentes do Ministério da Educação, o que foi gerador de permanente desestabilização do sistema e dos seus actores, além do mais porque esta dimensão andou quase sempre de braço dado com uma postura de falta de transparência e de seriedade.
Penso que o poder político terá percebido a lição de que não serão bem sucedidas quaisquer novas tentativas de domesticação impositiva, sem justificação ou racionalidade, de um grupo profissional altamente qualificado, esclarecido, exigente e interventivo, como são os professores.
À segunda parte da questão, penso já ter respondido na questão 1.

  • Uma última questão: que medida gostaria que fosse desde logo implementada com o arranque de funções do novo Ministério?
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Sem qualquer hesitação da minha parte, a primeira e mais emblemática das medidas a ser implementada, em conformidade com aquela que é a expectativa da quase generalidade dos professores, não pode ser outra que não a revogação do modelo de avaliação em vigor, fazendo cessar imediatamente todos os procedimentos e efeitos a ele inerentes, de forma a ficar muito claro que o novo Ministério da Educação não pactuará, nunca, com farsas ou processos menos sérios
Concomitante a esta decisão, devia o Ministério proceder, de imediato, à reabilitação e reorganização da Inspecção Geral da Educação, vocacionando-a para funções de avaliação/classificação dos professores. Se me é permitida outra sugestão, também me parece urgente a reposição da Área de Projecto de 12º ano, pelo que esta área curricular não disciplinar representa em termos de promoção do espírito científico e de capacitação dos alunos em múltiplos domínios de competências imprescindíveis à prossecução de estudos superiores e à profissionalidade, mesmo que a medida implicasse a suspensão, para reavaliação (podendo dar lugar a fusões, reformulações ou extinções), das áreas curriculares do ensino básico.

Octávio V. Gonçalves
Vila Real, 08-06-2011

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