21/07/2012

dos professores, a Santana Castilho

.
transcrevo aqui alguns dos comentários à 'nota'/ crónica «Uma Classe Zombie e um Ministro Bárbaro» que o Professor Santana Castilho colocou na sua página do facebook:
.

João Daniel Pereira : Nós estamos a ouvi-lo, professor. O medo vai dar lugar à resistência, acredite. Também estou na situação de "horário-zero", com 19 anos de serviço (18 na mesma escola). Obrigado pelo texto (que resume tudo o que se está a passar) e por assumir, de forma tão corajosa, a defesa da Escola Pública.
.
João Freitas Tem toda a razão professor. Parece mentira como foi possível juntar centenas de milhares de professores em manifestações contra a Ministra Maria de Lurdes, quando agora estamos parados, quase inertes...
Era este o ministro esperado? Era!
Eram estas as decisões esperadas? NÃO!
Então? Então? O que é preciso é união para travar a destruição do ensino, mas andamos todos a olhar para o umbigo!!!

Luís Sérgio Rolão Mendes Obrigado professor, é preciso romper com o medo e o oportunismo que ainda impera. Já vai sendo tempo de acordar e correr com este ministro ao serviço da troika, disposto a tudo para destruir os professores e a escola pública.
.
Maria Isabel Carvalho Parabéns pela crónica, Professor. Tem toda a razão...mas acredito que se começa a acordar (até pode ser devagarinho, mas começa...). Mas na Educação os professores são apenas um dos grupo de atores em "palco" e esse factor "pesa" a favor de Nuno Crato. Mas com os frutos desta politica educativa tão desastrosa, não será por muito tempo. Continuação de boas crónicas, Professor. Obrigada.
.
Paula Charrano Brilhante como sempre!

Olivia Dias Excelente como sempre. Devíamos ter um Ministro da Educação com as suas qualidades... A classe admira-o mais do que imagina. O Professor está sempre a ser citado nas salas de professores. Estamos atentos ao que escreve..

Mário Jorge Mais uma vez, obrigado Sr. Professor pela denúncia de um problema que foi criado pelo MEC e que se nada for feito pelos docentes quer estejam em DACL ou não, o ensino público corre sérios riscos de se degradar ainda mais. Estou convencido que todos os professores atentos aos problemas da educação não deixarão de refletir naquilo que o Sr. Professor diz. EXCELENTE SERVIÇO CÍVICO.

Isabel Campeão : Tem toda a razão, Professor. Estou aposentada, mas tenho a legitimidade de muitas lutas pela Escola Pública para sublinhar e comentar: "Os professores têm a legitimidade profissional de defender os interesses da classe." E foram capazes de descer a Lisboa mais de 100 mil. "E têm a responsabilidade cívica de defender a Escola Pública". Mas, infelizmente, sobre essa responsabilidade é necessário e bem importante que sejam chamados a acordar. Agora, é o risco de despedimento, ou de instabilidade para quem atingira uma situação julgada estável, e isso lamento e estou solidária pois é dramático para cada um em termos pessoais e familiares. Mas as razões que foram permitindo chegar a isso são gravíssimas para o futuro da nossa Escola Pública e da Educação, por isso gravíssimas para o país em que vão viver os nossos filhos e/ou netos. Tenho-me lembrado muito daquele poema atribuído a Brecht... 'Não era nada comigo...... Agora levam-me a mim, mas já é tarde'. Bem haja pelo que escreveu, pois o Professor é muitíssimo lido pelos docentes.

Duro Paul Muitos parabéns caro Santana. Um cidadão por excelência! Continue!

Luís Pedro Ribeiro Concordo e subscrevo. Obrigado, professor!
.

18/07/2012

Uma classe zombie e um ministro bárbaro

Santana Castilho, de novo e sempre, sofrendo as dores que são nossas, descobrindo-nos as feridas assim, sem paninhos quentes, o pus à vista, urgindo tratamento .. Nada. Os professores "comem e calam", sempre o fizeram, vergando-se (ainda que contrariados) aos devaneios tresloucados dos vários ministros que vão passando pela Educação, PSs ou PSDs. Apanham e parece que pedem mais. Queixam-se muito - na sala de professores. Manifestam-se na rua e depois voltam às suas escolas, cumprindo tudo, o rabinho metido entre as pernas. A maioria das vezes, só percebem a tempestade depois que o raio os atinge. Não embarcam em lutas "perigosas" tipo greves que (lhes) doam, não ousam, não têm ideias, não se informam, queixam-se só - e baixinho. Não Santana Castilho, que arrisca "gritar" bem alto. Que acusa, coberto de razão. Que se/nos informa. Que pensa por quem tinha, mais que ninguém, obrigação de pensar. Que aponta caminhos a quem teima em os não querer ver (greves de zelo, por exemplo? às matrículas, à formação de turmas.. ? ). Pois .. o tanto que se podia (devia!) fazer, e a mossa que isso ia causar, assim a classe o ouvisse !!!
AL


in Público, 18/7/2012
por Santana Castilho*
.

Uma classe zombie e um ministro bárbaro

Numa sexta-feira, 13, a tampa de um enorme esgoto foi aberta ante a complacência de uma classe que parece morta em vida. Nuno Crato exigiu e ameaçou: até 13 de Julho, os directores dos agrupamentos e das escolas que restam tiveram que indicar o número de professores que não irão ter horário no próximo ano-lectivo. Se não indicassem um só docente que pudesse vir a ficar sem serviço, sofreriam sanções. Esta ordem foi ilegítima. Porque as matrículas e a constituição de turmas que delas derivam não estavam concluídas a 13 de Julho. Porque os créditos de horas a atribuir às escolas, em função da deriva burocrática e delirante de Nuno Crato, não eram ainda conhecidos e a responsabilidade não é de mais ninguém senão dele próprio e dos seus ajudantes incompetentes. Não se conhecendo o número de turmas, não se conhecendo os cursos escolhidos pelos alunos e portanto as correspondentes disciplinas, não se conhecendo os referidos créditos, como se poderia calcular o número de professores? Mas, apesar de ilegítima, a ordem foi cumprida por directores dúcteis. Como fizeram? Indicaram, por larguíssimo excesso, horários zero. Milhares de professores dos “quadros” foram obrigados, assim, a concorrer a outras escolas por uma inexistência de serviço na sua, que se vai revelar falsa a breve trecho. Serão “repescados” mais tarde, mas ficarão até lá sujeitos a uma incerteza e a uma ansiedade evitáveis. Por que foi isto feito? Que sentido tem esta humilhação? Incapacidade grosseira de planeamento? Incompetência? Irresponsabilidade? Perfídia? Que férias vão ter estes professores, depois de um ano-lectivo esgotante? Em que condições anímicas se apresentarão para iniciar o próximo, bem pior? Que motivação os animará, depois de tamanha indignidade de tratamento, depois de terem a prova provada de que Nuno Crato não os olha como Professores mas, tão-só, como reles proletários descartáveis? É de bárbaro sujeitar famílias inteiras a esta provação dispensável. É de bárbaro a insensibilidade demonstrada. Depois do roubo dos subsídios, do aumento do horário de trabalho, da redução bruta dos tempos para gerir agrupamentos e turmas, da tábua rasa sobre os grupos de recrutamento com essa caricatura de rigor baptizada de “certificação de idoneidade”, da menorização ignara da Educação Física e do desporto escolar, da supina cretinice administrativa da fórmula com que o ministro quer medir tudo e todos, da antecipação ridícula de exames para o início do terceiro período e do folclórico prolongamento do ano-lectivo por mais um mês, esta pulseira electrónica posta na dignidade profissional dos professores foi demais.
Todas as medidas de intervenção no sistema de ensino impostas por Nuno Crato têm um objectivo dominante: reduzir professores e consequentes custos de funcionamento. O aumento do número de alunos por turma fará crescer o insucesso escolar e a indisciplina na sala de aula. Mas despede professores. A revisão curricular, sem nexo, sem visão sistémica, capciosa no seu enunciado, que acabou com algumas disciplinas e diminuiu consideravelmente as horas de outras, particularmente no secundário, não melhorará resultados, nem mesmo nas áreas reforçadas em carga horária. Mas despede professores. Uma distribuição de serviço feita agora ao minuto, quando antes era feita por “tempos-lectivos”, vai adulterar fortemente a continuidade da leccionação das mesmas turmas, em anos consecutivos, pelos mesmos professores (turmas de continuidade), com previsível diminuição dos resultados dos alunos. Mas despede professores. As modificações impostas à chamada “oferta formativa qualificante”, mandando às urtigas a propalada autonomia das escolas, substituídas nas decisões pelas “extintas” direcções-regionais (cuja continuidade já está garantida, com mudança de nome) não melhora o serviço dispensado aos alunos. Mas despede professores.
Ao que acima se enunciou, a classe tem assistido em letargia zombie. Não são pequenas ousadias kitsch ou jograis conjuntos de federações sindicais, federações de associações de pais e associações de directores, carpindo angústias e esmagamentos, que demovem a barbárie. Só a paramos com iniciativas que doam. Os professores têm a legitimidade profissional de defender os interesses da classe. Digo da classe, que não de cada um dos grupos dentro da classe. E têm a responsabilidade cívica de defender a Escola Pública, constitucionalmente protegida. Crato vai estatelar-se e perder-se no labirinto que criou para o ano-lectivo próximo. Perdidos tantos outros, é o tempo propício para um novo discurso político, orientador e agregador da classe. A quem fala manso e age duro, urge responder com maior dureza. Lamento ter que o dizer, mas há limites para tudo. Como? Assim a classe me ouvisse. Crato vergava num par de semanas. 

* Professor do ensino superior (s.castilho@netcabo.pt)

.............................................................................

comentários (retirados daqui ) :

João Daniel Pereira Nós estamos a ouvi-lo, professor. O medo vai dar lugar à resistência, acredite. Também estou na situação de "horário-zero", com 19 anos de serviço (18 na mesma escola). Obrigado pelo texto (que resume tudo o que se está a passar) e por assumir, de forma tão corajosa, a defesa da Escola Pública.
 
João Freitas Tem toda a razão professor. Parece mentira como foi possível juntar centenas de milhares de professores em manifestações contra a Ministra Maria de Lurdes, quando agora estamos parados, quase inertes...
Era este o ministro esperado? Era!
Eram estas as decisões esperadas? NÃO!
Então? Então? O que é preciso é união para travar a destruição do ensino, mas andamos todos a olhar para o umbigo!!!
 
Ana Oliveira ja qt aos contratados, nem sequer existem. é tudo "jovens", "recém-licenciados" e "com experiência" e nao ha problema.
 
Manuel Santos O povo anda muito manso, é verdade. Não são só os professores. Vergaram-nos a todos com a intervenção colonial e a contestação está a cargo de um ou outro quixote perdido e isolado... Até quando?
 
Felícia Martins Mortos não estamos ...aguardamos pelo "acordar do coma" de quem nos abandonou!
 
Manuel Santos Ninguém nos abandonou, a não ser nós mesmos...
 
Luís Sérgio Rolão Mendes Obrigado professor, é preciso romper com o medo e o oportunismo que ainda impera. Já vai sendo tempo de acordar e correr com este ministro ao serviço da troika, disposto a tudo para destruir os professores e a escola pública.
 
Maria Isabel Carvalho Parabéns pela crónica, Professor. Tem toda a razão...mas acredito que se começa a acordar (até pode ser devagarinho, mas começa...). Mas na Educação os professores são apenas um dos grupo de atores em "palco" e esse factor "pesa" a favor de Nuno Crato. Mas com os frutos desta politica educativa tão desastrosa, não será por muito tempo. Continuação de boas crónicas, Professor. Obrigada.
 
Paula Charrano Brilhante como sempre!
 
Olivia Dias Excelente como sempre. Deviamos ter um Ministro da Educação com as suas qualidades...
 
Olivia Dias A classe admira-o mais do que imagina. O Professor esta sempre a ser citado nas salas de professores. Estamos atentos ao que escreve...
 
Rui Soares Obrigado, professor.
 
Mário Jorge Mais uma vez, obrigado Sr. Professor pela denúncia de um problema que foi criado pelo MEC e que se nada for feito pelos docentes quer estejam em DACL ou não, o ensino público corre sérios riscos de se degradar ainda mais. Estou convencido que todos os professores atentos aos problemas da educação não deixarão de refletir naquilo que o Sr. Professor diz. EXCELENTE SERVIÇO CÍVICO.
 
Adélia Simões O Professor tem toda a razão mas vivemos numa sociedade de medos e ninguém toma iniciativa para se manifestar!
 
Paula Paulo Agradeço imenso a sua crónica Professor. Como de costume coloca o dedo na ferida. Nós não estamos em coma mas o que podemos fazer??? Sinceramente estou um bocado farta de ouvir toda a gente a protestar e de ler textos magníficos como o seu. Mas tudo resvala na indiferença do MEC que continua a fazer o que bem lhe apetece. Os representantes dos sindicatos preocupam-se com as suas "vidinhas" e pouco mais! Então, diga-nos o que fazer?????? Desde 1976, ano em que comecei a leccionar, só aparecem teorias! Quando passamos aos actos????? E que actos????? Não estou em coma. Quero fazer alguma coisa!
 
Graciete Teixeira O problema é só um: pensamos sempre no salve-se quem puder, olhamos apenas o próprio umbigo, onde vemos a lamparina mágica e enfiamos a cabeça, curvados sobre nós próprios. A maioria dos professores do quadro (que conheço) sorri face às declarações de Nuno Crato, esperando a lura adequada para se enfiar, os contratados aguardam o tempo da caça. Todos são culpados pelo extermínio da escola pública enquanto espaço de liberdade e de democraticidade, pelo desaparecimento da disciplina de Educação Tecnológica da matriz curricular do 3º ciclo, pelo despedimento e, acima de tudo, pela vergonha de pactuarem com o Nuno Crato. Isto tudo envergonha-me e dá-me vontade de começar à estalada e acho que devia começar e acabar pela casa, pois aí reside o mal de tudo.
 
Isabel Campeão Tem toda a razão, Professor. Estou aposentada, mas tenho a legitimidade de muitas lutas pela Escola Pública para sublinhar e comentar: "Os professores têm a legitimidade profissional de defender os interesses da classe." E foram capazes de descer a Lisboa mais de 100 mil. "E têm a responsabilidade cívica de defender a Escola Pública". Mas, infelizmente, sobre essa responsabilidade é necessário e bem importante que sejam chamados a acordar. Agora, é o risco de despedimento, ou de instabilidade para quem atingira uma situação julgada estável, e isso lamento e estou solidária pois é dramático para cada um em termos pessoais e familiares. Mas as razões que foram permitindo chegar a isso são gravíssimas para o futuro da nossa Escola Pública e da Educação, por isso gravíssimas para o país em que vão viver os nossos filhos e/ou netos. Tenho-me lembrado muito daquele poema atribuído a Brecht... 'Não era nada comigo...... Agora levam-me a mim, mas já é tarde'. Bem haja pelo que escreveu, pois o Professor é muitíssimo lido pelos docentes.
 
 
Duro Paul Muitos parabéns caro Santana. Um cidadão por excelência! Continue!
 
Luís Pedro Ribeiro Concordo e subscrevo. Obrigado, professor!
 
Manuel Vitorino Queiroz On the grass: os julgamentos in absentia são mais aborrecidos do que as execuções in effigie

Com as palavras emprestadas e adaptadas de Almada Negreiros:

BASTA PUM BASTA!
UMA GERAÇÃO, QUE CONSENTE DEIXAR-SE REPRESENTAR POR UM crato É UMA GERAÇÃO QUE NUNCA O FOI! É UM COIO D'INDIGENTES, D'INDIGNOS E DE CEGOS! É UMA RÊSMA DE CHARLATÃES E DE VENDIDOS, E SÓ PODE PARIR ABAIXO DE ZERO!

ABAIXO A GERAÇÃO!
 
O Cão Danado Professor Santana Castilho é com profundo pesar que eu, como professor contratado, vejo o atual isomorfismo da classe docente e, em grande parte, dos meus colegas professores contratados que, ao longo dos anos, têm vindo a sofrer cortes na sua dignidade profissional e no seu direito pleno ao trabalho. Não quero com isto dizer que a classe docente não tenha sofrido na sua plenitude, mas é com enorme angústia que vejo colegas contratados “comerem o pão que o diabo amassou”, muitas vezes com a complacência de outros professores nas escolas.
É com enorme tristeza que constato que muitas vezes é nas escolas que está o “inimigo”. Este inimigo é a total falta de solidariedade demonstrada por alguns. Os professores resistentes na escola atual são “achincalhados” por diretores zelosos e por professores “preguiçosos” que insistem em não honrar a profissão.
Neste momento em que escrevo, bravos professores lutam à frente do MEC com a esperança de conseguirem salvar a Escola Pública da tirania que foi imposta pelos sucessivos governos e, com especial ênfase, o atual.
Chegámos a este ponto em que o governo, em prol da bandeira masoquista da Troika, destrói por completo a educação em Portugal impondo uma série de medidas que visam a destruição de um sistema escolar público de qualidade.
Devo dizer que a esta altura já nada mais me surpreende pois, com o passar dos anos, assiste-se ao total desrespeito pelas leis e à destruição da figura do professor, o que resulta na devastação do seu orgulho profissional e numa incapacidade de lecionar com a qualidade desejada.

Obrigado Professor.
 
Rosa Carvalho Contundente e certeiro, aliás como sempre! Adorei o artigo, que já tinha lido em devido tempo! 
 
Joao Soares Zangado, Ramiro defende um economista que foi conselheiro do governo chileno de Augusto Pinochet e muitas de suas ideias foram aplicadas na primeira fase do governo Nixon e em boa parte do governo Reagan. Foram também muito apreciadas por Tatcher. Está tudo dito. Ou seja desfazem a escola pública, imperam as medidas economicistas, os professores andam em bolandas e depois pagam o triplo: mal pagos, turmas enormes e depois somos culpados da qualidade de ensino. Depois contratam professores da era global: migrantes da Índia, de outros países. Como já acontece com os médicos...É o falhanço do país (?)
 
Joao Soares Olhão Livre- muitos dos professores estão pobres, casos angustiantes que me chegam por email. Somos um casal de professores. Então a dose é a "dobrar"...A domesticação social começou com MLR e Sócrates. Vítor Gaspar e Paulo Portas agradecem.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

04/07/2012

A paranóia normativa e a permissividade escandalosa

Público, 4 de Julho de 2012
A paranóia normativa e a permissividade escandalosa
Santana Castilho *

1. Voltámos ao tempo das torrentes de legislação selvagem na Educação. Vale tudo para impor o reformismo louco de Nuno Crato. Menorizar as actividades físicas e desportivas da juventude em idade escolar é intelectualmente retrógrado, factualmente estúpido e pedagogicamente criminoso. Pôr os alunos do 1º ciclo a fazer exames no início do 3º período é demência pedagógica. Que vida terão no 3º período os professores e os alunos que já fizeram exame e já “passaram”? Prolongar por mais um mês o ano-lectivo para os alunos que vão “chumbar”, depois de durante o ano se terem retirado recursos para resolver problemas específicos de aprendizagem, é masoquismo pedagógico. Quem assim decide saberá em que condições chegam ao fim do ano professores e alunos? Pensar em novos “cursos de ensino vocacional” para crianças de nove ou dez anos de idade é darwinismo pedagógico, que anseia pela próxima etapa: ferrá-las no berço. Ordenar aos directores que indiquem a componente lectiva dos seus docentes, de dois a seis de Julho, quando tudo o que é necessário para a calcular não é ainda conhecido, é aldrabice pedagógica. 

A última pérola da paranóia normativa do ministro, as metas curriculares para o ensino básico, foi apresentada em conferência de imprensa. Nuno Crato, definitivamente convertido ao “eduquês”, disse que se destinam “a definir com clareza o que se quer que cada aluno aprenda” e que são “objectivos cognitivos muito claros para professores e alunos”. Oh, se são! Tão claros (especialmente para alunos) como se depreende dos nacos que transcrevo, a título de exemplo (os três primeiros de Português e os dois últimos de Educação Visual):

 - “Ler pelo menos 45 de 60 pseudo-palavras (sequências de letras que não têm significado mas que poderiam ser palavras em português) monossilábicas, dissilábicas e trissilábicas (em 4 sessões de 15 pseudo-palavras cada). “
- “ Ler corretamente, por minuto, no mínimo 40 palavras de uma lista de palavras de um texto apresentadas quase aleatoriamente”.
- “ Reunir numa sílaba os primeiros fonemas de duas palavras ( por exemplo, “cachorro irritado” --> “Ki”), cometendo poucos erros”.
- “Distinguir características dos vários materiais riscadores…”
- “Reconhecer e articular elementos da Teoria da Gestalt no âmbito da comunicação (continuidade, segregação, semelhança, unidade, proximidade, pregnância e fechamento).” 

Gosto particularmente, em matéria de clareza, do “quase aleatoriamente” (julgava eu que ou era aleatoriamente ou sequencialmente e fim de papo) e do “cometendo poucos erros” (dez serão poucos?). Em matéria de erudição desvanecem-me, dado que nos ocupamos do ensino básico, aquela cena do “cachorro irritado”, os “materiais riscadores”, a “pregnância” e o “fechamento”. Se quiserem muito mais, sirvam-se. Só para o Português e Matemática são para aí 180 objectivos e só 700 descritores. Fora o resto. É óbvio que meninos e professores agora é que se vão concentrar em tão poucas metas, os primeiros aprendendo como nunca e os segundos ensinando como jamais.

2. A história é rápida de contar mas já demorou demasiado a resolver. A 16 de Julho de 2011, verificou-se a eleição do actual director do Agrupamento de Escolas de Dr. João Araújo Correia, de Peso da Régua. O acto viria a ser impugnado junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, por outro candidato, que alegou ter o eleito prestado falsas declarações, designadamente dizendo possuir uma licenciatura que nunca possuiu. Do mesmo passo, a Inspecção-Geral da Educação e Ciência abriu um inquérito. Passou quase um ano e não há decisão sobre uma coisa que não precisaria de qualquer inquérito. Com efeito, é exigível que os serviços administrativos certifiquem, na hora, se um professor é licenciado ou não, sendo certo que há anos lhe paga como tal e até o nomeou Professor Titular, quando a categoria existia e exigia o grau de licenciado. A universidade onde o director estudou certificou que ele não tinha concluído a licenciatura. Essa certidão é do conhecimento dos intervenientes. Entretanto, houve decisão judicial, que anulou o acto de admissão a concurso do actual director, considerou que ele prestou falsas declarações no que toca à licenciatura e mandou repetir o processo, com a sua exclusão. Desta decisão podia recorrer o director, que recorreu, e a Direção-regional de Educação do Norte que, ao não recorrer, aceitou a decisão do tribunal. Exige-se, agora, rápida prova de vida do secretário de Estado do Ensino e Administração Educativa, que também está ao corrente desta saga, ou do director-regional de educação do Norte ou da inspectora-geral da Educação e Ciência. Ou deles todos, de mãozinhas dadas, por causa dos papões autárquicos. É que o processo judicial é uma coisa e o disciplinar outra. Conhecida a falta, correm prazos e há prescrições. O costume.

* Professor do ensino superior (s.castilho@netcabo.pt)